A origem camponesa foi o que lhe permitiu a íntima relação com o húmus da música da terra mãe e lhe teceu a capacidade de utilizar instrumentos raramente tratados por outros: pilon, pau de colêxa, búzios, shelafon... Sons de outra têmpera que foram construindo o mundo melódico de um compositor que se destacou, nos últimos anos, como o principal estudioso das sonoridades da mundividência cabo-verdiana, dos «ecos» de trabalho - seja no pátio da casa, no trapiche do grogue, na courela ressequida -, dos acordes que fazem passar o tempo de espera por chuva e marcam casamentos, crenças, rodas. Ele era uma espécie de captador etnográfico com vestimenta de feiticeiro ouvidor de sons onde outros sabem ver ruídos apenas.
Mas a sua acção enquanto compositor não se queda nestes aspectos peculiares. Enquanto instrumentista, acompanhou a «tournée» internacional de Ildo Lobo (1998), tendo composto para ele o êxito «Tunuca». E os lisboetas puderam surpreender-se com a sua força interpretativa (uma vibração telúrica que aliava sabiamente a radicalidade de raiz africana com o que de mais avançado se vai fazendo pelo Mundo) quando foram ao CCB ver o grupo Raiz di Polon, que integrava, apresentar CV Matgrix 25 e Pêtu, duas peças em que representava e tinha a responsabilidade da direcção musical.
O primeiro dia de Março deixou muito mais pobre a música das ilhas crioulas. Mas é toda a noção de Cultura em Cabo Verde, e não só, que fica ferida com a partida do Orlando Pantera.